sábado, 10 de dezembro de 2011

RETINA - Trilogia final / Comentários







RETINA-TRILOGIA FINAL é um espetáculo vigoroso. Isso é evidente nos 50 minu tos de sua duração no palco.
Revisto na noite de hoje (09/12/2011), novamente no palco do teatro do Centro Cultural Humberto Mauro de Cataguases-MG, a energia emanada pelo corpo de baile da CIA ORMEO deixa claro que o movimento rápido, preciso, quase contundente como os pontiagudos saltos dos sapatos das bailarinas, foi privilegiado pela diretora da companhia, Daniela Guimarães.
Uma trilogia pressupõe a existência de 3 programas distintos porém com um leit-motiv comum: a experimentação sobre a interatividade corpo-imagem. Nao assisti aos 2 primeiros espetáculos que compõe esse tríduo, entretanto, pela qualidade do desta noite, que resume todos os anteriores, o objetivo foi plenamente atingido.
Uma dezena de bailarinos em cena, circulando entre placas de acrílico que ora criam cidades, construções, espaços privados, ruas e muros que limitam, protegem, isolam, impedem. O homem em seu habitat, com o outro, consigo mesmo. O espaço urbano que tanto congrega quanto aparta. Os sons da cidade, os sons do homem. O angustiante som do silêncio.
Deformando a realidade, desmaterializando o ser humano, criando recortes para a observação de novos significados, o cenário é a décima primeira figura em cena. Uma vez porta, noutra, janela; véu, em alguns momentos, lâminas laboratoriais noutros, as linhas ondulantes das retangulares telhas de PVC sao translúcidas o suficiente para perceber-se o humano por detrás delas, e opacas o bastante para descaracterizar e padronizar a vida que só revelam em sombras.
Mariana Terra, responsável pelo belíssimo desenho de luz, utilizou uma paleta de cores incomum em espetáculos desse tipo, exaltando o vermelho e o verde, o interior (sangue) e o exterior (natureza), o pare (vermelho) e o siga (verde), o permitido e o proibido. O resultado surpreende e acrescenta a luz como elemento fundamental para sinalizar estados d'alma, o caos e a energia da urbe, a liberdade e a contenção dos seus habitantes.
Elizabeth Scaldaferri, em belos, vigorosos e lentos movimentos, abre o programa, equilibrando-se em sapatos de altíssimos saltos. Elementos fetiche, símbolos do consumismo e do poder, esses stilleti atravessam toda a apresentação, e anunciam seu término ao serem despidos dos pés e colocados no proscênio, num ato de total despojamento e de convite para que outros os calcem e dancem a sua frenética dança.
David Peixoto, com a sua formaçao em street-dance e hip-hop, traz brilhantemente, o maneirismo, o gestual e a cacofonia da cidade. Seu copo, de uma extraordinária elasticidade, é a mais realista expressão do homem que transita pelo espaço urbano, relacionando-se com os outros e construindo seus próprios limites, domínios e horizontes. Ainda que seus movimentos estejam em perfeito sincronismo com todos os demais, a naturalidade de suas expressões, o frescor da improvisação e a prazeirosa entrega ao seu ofício, faz com que sua presença seja um dos pontos altos desse eloquente espetáculo.
Carlos Gonçalves e os "veteranos" Joel Rocha e Marcus Diego, trazem a medida certa de energia necessária para o palco, vivendo diferentes personagens em múltiplas situações.
Bianca Clarimundo, Deliana Domingues, Rayane Rodrigues e Tatiane Dias sao corretas, precisas, transformando emoções em passos de dança, sentimentos em gestos às vezes contidos, mínimos, e noutras, caudalosos, incontidos, expansionistas, arrebatadores.
Daniela Guimarães, além de assinar a direção geral e a concepção cenografia, traz consigo o brilho do talento burilado no estudo e prática contínuos. Sua presença em cena é arrebatadora e tem um pathos que só os grandes artistas conseguem transmitir.
A CIA ORMEO, criada em 2003, já demonstra, com RETINA - TRILOGIA FINAL, estar vivenciando uma maioridade artística conquistada através do trabalho continuado, dos incentivos oferecidos, de um repertório que só faz crescer e da presença em palcos nacionais e internacionais. Cataguases pode se orgulhar em ter um grupo de dança respeitado e respeitável, que carrega consigo além-fronteiras, a herança dessa terra e de seu povo para as artes.
Com o patrocínio da ENERGISA e da Lei Estadual de Incentivo à Cultura do Governo de Minas Gerais, essa companhia mantém estreitos laços, desde a sua criação, com a Fundação Cultural Ormeo Junqueira Botelho.

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