sexta-feira, 28 de novembro de 2014

"O demônio do meio dia" : Godard x Luiz Raphael Domingues Rosa




Há paisagens que parecem existir apenas na imaginação. Construídas em cores lânguidas, ângulos improváveis , perspectivas e proporções irreais, elas não se comprometem com o real, mas o recriam como ele deveria, ou poderia, ser.

Entre morros e colinas, roças e chácaras, entre o acobreado mineral da terra e uma vasta paleta de verdes, a Catedral de São Sebastião se revela, quase timidamente, na paisagem ensolarada do quase meio-dia. À distância, no curvilíneo horizonte, as antenas no Morro do Cruzeiro replicam, na forma, a torre do sino da igreja.

Tudo é silêncio na paisagem. Nada se move, nem as folhas das palmeiras, nem as ramas do capim ou a copa das árvores. Nuvens não há. Pássaros a voar, não há. Como se o Tempo houvesse parado, permitindo-se também observar, sob a claridade solar, os vestígios das construções despontando em meio à paisagem rural.

Luiz Raphael Domingues Rosa criou um pequeno retábulo, uma peça devocional, uma joia em termos de composição, cor, simbolismo e emoção. Não se fica indiferente diante dessa representação de Leopoldina pois, como toda obra de arte, ela nos fala diretamente aos sentidos, instigando nossa imaginação, provocando emoções, fazendo com que uma parte de nós se identifique profundamente com aquilo que vê.

Como os artistas que se dedicaram a pintar o Paraíso terrestre, a Jerusalém celeste, o artista leopoldinense Luiz Raphael, esteticamente despreocupado com a realidade objetiva, retrata sua amantíssima cidade como se quisesse dar forma a uma lenda, como se estivesse ilustrando uma fábula, como se com tintas e pincéis, esse mago das cores (citando Serginho do Rock) eternizasse, tornando definitivamente mitológica, a sua pequena Leopoldina.

O artista batizou essa obra como “O demônio do meio-dia”, numa clara alusão ao filme “Pierrot le Fou” (1965), de Jean-Luc Godard. Podemos, então, tentar encontrar um paralelo entre essa obra cinematográfica e a pintura em questão, se nos ativermos ao fato que esse filme fala de romance e das suas implicações, sendo um drama sobre escolhas e do enfrentamento das dificuldades. Por isso mesmo é um filme sobre a vida, sobre o destino e sobre o aceitar desse destino, onde o herói (ou anti-herói) encontra conforto na literatura e nas artes. E quem mais do que Luiz Raphael Domingues Rosa aceitou seu destino e escolheu viver uma vida de inteira entrega à Arte, fosse na preservação da memória do poeta Augusto dos Anjos (literatura), ou, através da sua obra pictórica, preservando a memória da sua Leopoldina?

Quadro: “O demônio do meio-dia” remissivo a Pierrot le Fou – Godard / pintado no Espaço dos Anjos – julho 1993 – Leopoldina - Luiz Raphael

Acervo: Dr. Ormeo de Faria Filho


Ainda que este quadro não faça parte da exposição “LEOPOLDINA E LUIZ RAPHAEL: UM CASO DE AMOR”, convidamos todos a visitarem a mostra e apreciarem as mais de 2 dezenas de obras desse grande artista gentilmente cedidas pelos seus atuais proprietários.

A exposição, que continua até o dia 20 de dezembro na Casa de Leitura Lya Botelho, em Leopoldina-MG, é patrocinada pela ENERGISA e tem o Apoio Institucional da FOJB-Fundação Ormeo Junqueira Botelho.

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